Um domingo bonito de sol, acordei e percebi que meu marido não estava mais ao meu lado. Levantei e fui procurá-lo, encontrei-o diante o espelho. Sem perceber a minha presença, iniciou o processo de fazer a barba deixando a pele do rosto bem lisinha. Fiquei ali em silêncio, observando o seu ritual e também os primeiros fios de cabelos brancos, realçados pela luz do sol que entrava pela fresta da janela.
Isso me trouxe a consciência parte do conjunto de símbolos que para mim, representa o ser masculino, e também parte do que representa a passagem do tempo, os fios de cabelos brancos. Em momentos como esse a reflexão se faz presente e percebi que ambos estamos envelhecendo, mas também percebi que há diferenças na maneira como homens e mulheres encaram o envelhecimento.
Temos um Centro de Longevidade e atualmente só temos mulheres, aliás, mais de 100 mulheres. Aí vem a pergunta que não quer calar, por que os maridos não frequentam? Temos algumas alunas viúvas, mas em sua maioria são casadas e os maridos, a maioria também já são aposentados. A resposta de nossas alunas: “ah…o meu marido fica a tarde toda na televisão, e ainda reclama, porque diz que eu não paro mais em casa, mas agora eu tenho coragem de dizer, bom, eu te convidei e é você que não quer ir, mas tchau, eu vou”.
O que algumas pesquisas nos trazem a respeito das diferenças de gênero no processo de envelhecimento é que os homens em geral não gostam e não procuram ajuda médica, a não ser quando acontece algo mais grave, e quando precisam ainda resistem a obedecer aos tratamentos. São mais propensos a fumar, beber em excesso, a engordar, não gostam de seguir uma dieta e também correm mais riscos na vida.
A aparência na velhice masculina não é tão centrada na aparência como é na mulher. A preocupação dos homens está mais relacionado ao papel social, já que querem continuar sendo úteis, ativos, produtivos e provedores. O envelhecimento masculino vem muitas vezes acompanhado pelo medo, vergonha, da mudança de papeis, deixar de ser o protetor, provedor para ser alguém que de repente precisa de cuidados. Aí quando vem a aposentadoria, sentem-se incapazes por sua força de trabalho não ser mais considerada interessante para o mercado de trabalho, com essa nova realidade acabam ficando perdidos, conforme o relato de outra aluna: “nossa, não sei o que fazer com o meu marido em casa, agora que se aposentou, trombamos a todo momento, ele não encontra o espaço dele, parece perdido, aí reclama quando eu saio.”
Muito provavelmente, esse comportamento seja o reflexo de toda uma vida, pautada na figura do homem másculo, forte, provedor, que exercia o poder sobre a família e dominava o espaço público. Entretanto, com o advento da idade e da aposentadoria, esse homem terá que “aprender” a conviver e a interagir no espaço social historicamente reservado à mulher, que é o espaço doméstico e a família.
Talvez, a vergonha, o medo da nova realidade, seja um dos motivos que faz com que os homens sejam mais reservados do que as mulheres na velhice. O que os homens querem agora é ter o aconchego da família e do lar, mas terão que lidar com a resistência e falta de flexibilidade ao lidar com mudanças, criar novos papéis, pois parece perdido, conforme relato acima, em um espaço que nunca lhe foi atribuído.
Quanto as mulheres, ao chegar aos 60 anos, deixam de se preocupar com os padrões estéticos, assumem a própria identidade, e param de se preocupar com o que os outros estão pensando ou dizendo. Quando mais jovens, elas não puderam ser livres, cuidavam da casa, dos filhos, do marido e muitas trabalhando fora. Agora, querem a liberdade para viverem de acordo com suas próprias regras, valorizam muito o tempo que tem, seja estudando, saindo com a família, com as amigas, indo ao cinema, tomando o chá da tarde, enfim, apreciam tudo o que a vida lhe oferecer. Elas também gostam do aconchego da família, mas também gostam de falar muito, dar muita risada, viajar, dançar, cantar.
Por mais que hajam diferenças no envelhecer de homens e mulheres, faz-se necessário que ambos cultivem a autonomia física, psíquica e financeira, valorizando e cultivando a liberdade, dignidade, respeito e sabedoria, para que todos possam envelhecer com muita qualidade de vida, saboreando e celebrando a vida!
E você caro leitor, o que você pode acrescentar em seu dia a dia para iluminar sua vida?
Pós-graduada em Neurociências aplicadas a Longevidade – UFRJ
Pós-graduada em Atividade Física e Qualidade de Vida – UNICAMP
Mestre em Educação Física – UNIMEP
Sócia-Diretora do Centro de Longevidade e Atualização de Piracicaba – CLAP
Buda em sua infinita sabedoria nos deixou uma frase de grande ensinamento: “não resida no passado, não sonhe no futuro, concentre sua mente no momento presente” . Essa frase nos deixa claro que o grande problema de perturbação mental é não estar no momento presente, principalmente porque se não estamos no presente significa que não estamos conscientes e consequentemente, ficamos mais vulneráveis às nossas percepções.
O tempo todo nosso cérebro está trabalhando interpretando as informações que recebemos do meio externo (recebidas por nossos órgãos do sentido). No entanto, a interpretação dessas informações pode ser alterada pela nossa parte interna, pelo nosso sistema límbico que coordena nossas emoções. Ou seja, muitas vezes a realidade do evento é modificada pela nossa percepção, muitas vezes inconsciente (onde habitam nossos medos, traumas e inseguranças).
A nossa percepção de um evento, de uma pessoa, ou de um fato, segundo Yongey Rinpoche (2007) pode ser prejudicada em função de três aflições mentais ou “perturbadores”: ignorância, apego e aversão. A ignorância considerada por Cícero (45 a.C) “a maior enfermidade do gênero humano” está relacionada ao nosso desconhecimento, a nossa falta de informação em relação a um evento, uma pessoa ou coisa e, em função dessa nossa ignorância podemos errar em nosso julgamento. Voltando àquela frase inicial de Buda, entendemos que o perigo de sonhar com o futuro, ou sofrer por ele está justamente no fato de não conhecermos esse futuro, pois se ele não aconteceu ainda, é desconhecido, não sendo uma realidade. E é justamente esse um dos maiores sintomas da ansiedade: ficamos em alerta, nos “defendendo” de algo, ou de alguém que na verdade não estamos em contato real.
Outro aspecto citado na frase de Buda trata da questão do apego; uma vez que residir no passado é estar apegado a ele, é estar apegado a pensamentos, a acontecimentos que já tivemos, mas que na realidade já passaram. Muitas vezes ficamos presos a algumas crenças e lembranças porque imaginamos que elas nos protegem da mudança e/ou justificam nossas verdades. Dessa maneira, embora muitas vezes o fator de apego nos faça mal continuamos apegados a ele simplesmente porque ele nos dá a certeza de algo conhecido e com isso não nos permitimos enxergar o real, o presente.
E, a terceira aflição a aversão pode ser caracterizada por uma repulsa, ódio, rancor a uma determinada pessoa, a uma determinada situação e na grande maioria das vezes a aversão surge porque não nos permitimos refletir, avaliar uma pessoa ou uma situação com um sentimento de compaixão ou generosidade. Segundo Yongey Rinpoche (2007) “ cada forte apego gera um medo igualmente poderoso de não conseguirmos o que queremos ou de perdermos tudo o que já conseguimos”.
As aflições mentais fazem parte de nossa vida, principalmente porque somos seres humanos e somos dotados de emoção. No entanto, somos dotados também de algo que nos diferencia de todos os outros animais que é a capacidade de refletir e pensar e, é justamente quando usamos esse privilégio que podemos nos proteger mais das armadilhas colocadas por nossas emoções aprisionadas. São essas emoções passadas, ou futuras que nos impossibilitam de viver no presente, vendam nossos olhos para o real e fecham as portas para o novo.
Não por acaso, muitos pesquisadores entre eles Richard Davidson vem apontando o conceito do saborear (saborear o momento, saborear um abraço, uma música, uma comida) como uma das habilidades mais importantes para a felicidade. O saborear nos permite estar atento e consciente do presente.
Finalizo o texto de hoje com uma das minhas frases favoritas de Jung “ até você se tornar consciente, o inconsciente irá dirigir a sua vida e você vai chama-lo de destino”
O presente recebe esse nome porque é uma dádiva, viva-o!!!!!
Até a próxima,
Namastê!!!
Se observarmos com atenção, perceberemos que ao nosso redor existem vários heróis anônimos, pessoas que conseguem ser fortes, diferenciadas e nos transmitem algo com suas histórias…
Semana retrasada assisti a um concerto do pianista e mastro João Carlos Martins. É o terceiro que assisto e, pela terceira vez me emociono profundamente, vê- lo tocando ou regendo mexe com minhas emoções, me comove tanto que o enxergo como uma espécie de herói, de mito. Sim, porque para mim, heróis e mitos são pessoas reais com forças “sobrenaturais”, inexplicáveis para transformar tragédias em histórias de aprendizagens para os que os cercam.
São pessoas que se reconstroem diante de um problema, que tiram forças de seu interior e continuam seguindo em frente sem se lamentar ou olhar para trás. E o que esse maestro, orgulhosamente brasileiro, fez foi talvez até mais que isso: transformou momentos trágicos e dolorosos de sua vida em momentos de superação, aprendizados e projetos em prol do outro.
Em sua trajetória, bem resumidamente, ele passou por inúmeras cirurgias em função de um acidente que por ironia do destino afeta seu principal instrumento de trabalho, sua mão, passou depois por um assalto e por problemas de saúde; por várias vezes ouviu dos médicos que sua vida na música tinha acabado. Imagina o que significa para uma pessoa que vive da música com uma carreira internacionalmente reconhecida ouvir que estaria impossibilitado de tocar?
Pois bem agora imagine que essa sentença foi dada a uma pessoa especial, um herói que por mais de uma vez decide não aceita-la mas sim, ressignificá-la…. dá para imaginar a força da motivação e da superação desse homem??? Ele se reinventa, ele aprende a tocar de outras formas, ele se descobre um maestro talentoso, se descobre também caçador de talentos através de seu belíssimo projeto “Fundação Bachiana” que visa oferecer novas possibilidades através da música à jovens de comunidades carentes.
Pela vida de João Carlos Martins podemos observar três atitudes importantes que a ciência tem comprovado estarem diretamente relacionadas a felicidade e a longevidade: propósito de vida (que motiva a seguir em frente), aprendizado constante (que possibilita o brotamento de novas redes neurais) e compaixão/generosidade (através do trabalho ao próximo, o doar-se ao próximo, o colocar-se no lugar do outro).
Com essas atitudes ele segue com eximia maestria encantando a todos no espetáculo da vida, segue olhando para frente abrindo as cortinas da vida para novas possibilidades, permitindo que a sua história sirva de exemplo e inspiração para tantos outros jovens que poderiam se perder na vida ou até mesmo desistir dela.
A vida e obra de João Carlos Martins nos serve de exemplo e ensinamento para que possamos entender que sempre existem novas possibilidades, que sempre devemos seguir em frente regendo nossa vida ainda que os acordes, por vezes, possam estar fora do compasso.
Minha mais profunda admiração e respeito a esse herói brasileiro
Até a próxima,
Namastê
Sócia-diretora do centro de longevidade e atualização de Piracicaba (CLAP); mestre em educação física, pós-graduada em neurociência e pós-graduada em psicossomática.
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